Quando pensei em escrever algo sobre você, Rodney, confesso que fiquei em dúvida em relação à qual dessas características deveria realçar. No entanto, logo percebi que falando sobre quaisquer de suas facetas, terminaria por delinear-lhe o perfil, pois sempre foi de fácil percepção a inconfundível marca que lhe perpassou a vida, ou seja, a plenitude com que você vivia cada sentimento.
Lembro-me bem, Rodney, de uma semana que Vilani e eu passamos no Rio Janeiro, quando você ali cursava residência médica. Como estávamos de férias, Vilani, um tanto preocupada, comentava que não podíamos abusar de sua solicitude, e isso lhe poderia atrapalhar a rotina acadêmica.
Eu a tranquilizava dizendo da certeza de que a imersão do Rodney residente nas atividades era equivalente e proporcional à intensidade de sua benevolência e presteza, quando estava nos ciceroneando.
Naqueles dias, em nossos roteiros, percorrendo os típicos recantos cariocas, lembro-me que você, sorrindo, ou quase, seguia explicando detalhadamente os principais aspectos geográficos da Cidade Maravilhosa. E tampouco esqueço que, ao passarmos pelo bar “Garota de Ipanema”, eu falei que não havia necessidade de pararmos, pois nos bastava vê-lo de passagem. Infalível foi seu contra-argumento de que de nada adiantaria passar em frente ao lendário bar sem parar para conhecê-lo nos detalhes internos.
Da mesma forma, em Vila Isabel, onde você fez questão de também estacionar o carro para passearmos pelas calçadas onde estão gravados acordes de Noel Rosa, já que você sabia do meu interesse. Aliás, algum tempo depois, ao cometer o poema “Cenas Cariocas” – constante de nosso livro Incerto Caminhar –, canhestramente registrei algo em relação àquele momento.
Rodney, como foi valioso você ter vivido intensamente cada momento de sua vida... Extremado filho, seu carinho e preocupação com seus pais, Lizete e Renato, emocionava. Seu amor por Ilnara, saltava aos olhos. Do zelo para com seus pequenos filhos, nem se fale.
E com seus amigos?
Ah, Rodney, qualquer um de nós, ao ser saudado por você, sentia que sua festa conosco nunca era “da boca pra fora”. Além de perguntar por esposa, filhos e familiares, você também demonstrava real interesse pelo que estávamos fazendo na vida profissional, essas coisas.
Palavras e gestos característicos dos que regam amizades, com o mesmo esmero de quem cuida de um belo pomar.
No entanto, Rodney, sexta-feira passada, como se fosse um soco no estômago, recebi a notícia de que você havia partido. Tomado de tristeza, tentei direcionar meu pensamento para você vivo, ágil, intercalando a sisudez da consulta médica com algo de pitoresco de nossa Mossoró.
A cada retorno a seu consultório, ao ouvir-lhe o diagnóstico de aumento de meu grau, eu reclamava em tom de blague: “é a velhice chegando...”. E você, invariavelmente, reagia amenizando: “O que isso, homem? somos quase da mesma idade...”
Rodney, sabemos não existir palavras que sirvam de bálsamo para amenizar a dor que dilacera o coração dos seus, que ficam. Qualquer argumento ou gesto, mesmo aceito e entendido como manifestação de amizade, infelizmente pouco adiantará.
Consciente disso, faço este singelo comentário apenas como forma de registrar, para seus filhos, a lição por você legada, e que somente consigo definir valendo-me de Fernando Pessoa: “Para ser grande, sê inteiro”.
Saudades, Rodney.
David Leite é advogado, professor, escritor e atual chefe de Gabinete da Reitoria da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN).
Texto extraído do blog de Carlos Santos
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